Nos dias 10 e 11 de dezembro de 2025, o Instituto Tecnológico dos Plásticos (Aimplas) reuniu, em Valência, mais de uma centena de profissionais nacionais e internacionais da área da reciclagem de plásticos, no âmbito da terceira edição do Seminário Internacional de Reciclagem de Plásticos — Plasrec. Este fórum especializado contou com mais de 20 apresentações técnicas, que abordaram os desafios regulamentares, económicos e tecnológicos que influenciam a competitividade da indústria europeia da reciclagem, num contexto marcado pela transição para a economia circular e pela crescente pressão regulamentar da União Europeia.
Reciclagem de plásticos, uma questão estratégica para a Europa
Molina também destacou que a entrada progressiva em vigor da Lei de Aceleração da Descarbonização Industrial e da nova Lei da Economia Circular marcará um ponto de viragem para a indústria, com novos requisitos de rastreabilidade, triagem e qualidade do material reciclado. “A Europa decidiu reter, transformar e recuperar os seus próprios resíduos. Uma mudança que em breve será tangível para a indústria”, afirmou.
Tsunami regulamentar e perda de competitividade
Óscar Hernández, CEO da Anarpla, sublinhou que o setor da reciclagem enfrenta um verdadeiro ‘tsunami regulamentar’, agravado pela falta de controlo das importações de reciclados de baixo custo e pela concorrência do plástico virgem. Embora a capacidade de reciclagem na Europa tenha atingido 13 milhões de toneladas, Hernández advertiu que os objetivos para 2030 estão em risco devido à estagnação e ao encerramento de fábricas na UE. Para inverter esta situação, defendeu a necessidade de restabelecer condições de concorrência equitativas e de reduzir os custos energéticos que penalizam o setor.
Cristina Galán, representante da Anaip, explicou em seguida que os próximos anos serão decisivos para a transformação da conceção ecológica das embalagens na Europa. Galán explicou que a entrada em vigor do Regulamento Europeu sobre Embalagens e Resíduos de Embalagens (PPWR), obrigará a que todas as embalagens sejam recicláveis ao abrigo de um quadro metodológico harmonizado que garanta a sua segurança, sustentabilidade e qualidade do material reciclado.
A Comissão Europeia tenciona adotar atos de execução que definam o cálculo e a verificação do conteúdo reciclado, bem como adotar um rótulo harmonizado, também em formato digital, e um método oficial baseado em tecnologias de marcação para identificar a composição das embalagens, incluindo os materiais compósitos. A partir de 12 de agosto de 2026, deixará de ser possível comercializar embalagens em contacto com os alimentos que contenham PFASs acima dos limites estabelecidos pelo regulamento.
Galán salientou também que será atingido um novo marco em 2028, quando todas as embalagens sujeitas a conteúdo reciclado tiverem de indicar a sua percentagem de material reciclado ou de base biológica de acordo com as especificações oficiais. “O design para reciclagem deixará de ser uma recomendação e passará a ser um requisito legal”, afirmou.
Impacto industrial do novo quadro regulamentar
A complexidade do contexto industrial refletiu-se na intervenção de Irene Mora, representante da Plastics Europe, que analisou a deterioração da competitividade do setor na Europa. Mora explicou que a produção europeia de plásticos caiu 12,4% desde 2018, que quase 3.000 empresas fecharam desde 2022 e que cerca de 35.000 empregos foram perdidos nesse período.
Este declínio, associado ao crescimento acelerado em regiões como a China, coloca a Europa num momento crítico, precisamente quando o novo quadro regulamentar entra em vigor. Irene Mora sublinhou que a aplicação do PPWR em 2026 exigirá uma maior disponibilidade de material reciclado, sistemas de recolha e triagem mais eficientes e uma maior rastreabilidade em todos os fluxos. “A indústria precisa de segurança jurídica e de condições equitativas para competir. Sem isso, será difícil cumprir os objetivos de circularidade para 2030 e 2050”.
Tecnologias de recolha, triagem e valorização
Daniel Carrero, em representação da Picvisa, apresentou um sistema de trituração, separação e triagem de plásticos de solas de sapatos utilizando visão artificial, capaz de gerar um material recuperado denominado ‘Ecoflake’. Como explicou, “a visão artificial permite recuperar materiais que antes se perdiam sistematicamente. Representa um salto de eficiência na classificação antes da reciclagem”, sublinhando o papel estratégico destas tecnologias face aos requisitos de qualidade mais elevados exigidos pela regulamentação europeia.
Marc Puyuelo, da Coleo, abordou o desafio colocado pelas fibras sintéticas no setor têxtil e o seu potencial para uma reciclagem verdadeiramente circular, enquanto Albert Sabala, da Hera Holding, analisou a evolução do setor a ‘três velocidades’: um rápido progresso tecnológico, uma regulamentação que tenta acompanhar o ritmo e um mercado que, apesar de responder às exigências da sustentabilidade, continua a enfrentar obstáculos estruturais. A sessão terminou com Ettore Musacchi, da Associação Europeia de Reciclagem de Pneus (Etra), que abordou o alinhamento da reciclagem de pneus com o Pacto Verde Europeu e o impacto da competitividade e das novas tecnologias no futuro do setor.
Resíduos complexos e reciclagem avançada
No bloco seguinte, Adrián Morales, da Aimplas, apresentou as tecnologias inovadoras desenvolvidas para a reciclagem de resíduos complexos, como as baterias de iões de lítio, os componentes elétricos e eletrónicos e as embalagens multicamadas. Ángel Martínez, da Acteco, descreveu uma situação de ‘guerra’ e um ‘sistema em colapso’ devido ao encerramento de instalações, embora tenha apontado oportunidades associadas a tecnologias emergentes como a reciclagem hidrotérmica, com a capacidade de gerar materiais de muito alta qualidade.
Vincent Rerat, da Brüggemann, apresentou as soluções Bruggolen R-8897 e R-8899 para melhorar a qualidade e o desempenho do PP/EPDM pós-consumo, explicando como os aditivos podem otimizar a compatibilidade e prolongar a vida útil do material reciclado. José Antonio Alarcón, da Petcore, abordou os desafios técnicos e regulamentares da reciclagem de tabuleiros multicamadas e as soluções emergentes para melhorar a sua reciclabilidade sem comprometer a funcionalidade da embalagem.
O primeiro dia terminou com a votação do público para escolher a equipa vencedora da ‘hackathon’ desenvolvida em paralelo com as sessões, organizada pela Cátedra Aimplas-UV.
Reciclagem química e novas rotas tecnológicas
Durante o segundo dia, Santiago Llopis, da Aimplas, deu uma visão geral das técnicas de reciclagem química existentes, desde as mais consolidadas até às inovações mais recentes. Richard Aceituno, da GSF, abordou as técnicas de pirólise e a utilização de catalisadores para melhorar a qualidade dos produtos líquidos e eliminar contaminantes como halogéneos, metais e heteroátomos. Irene Méndez, da Entzimatiko, apresentou soluções de despolimerização enzimática e o potencial da biotecnologia para a reciclagem avançada de plásticos e têxteis. Hernán Calvo, da Plastic Energy, defendeu a reciclagem química como um motor da economia circular, destacando as oportunidades de mercado e os modelos de colaboração para aumentar a escala. Jorge Ávila, da Modus/Intecsa, apresentou o primeiro projeto industrial de reciclagem química de poliéster em Espanha.
Oliver Dietrich, da Messer, mostrou aplicações de reciclagem mecânica com azoto líquido, enquanto Carlos Gómez, da Promak, apresentou as vantagens do sistema de duplo parafuso Bandera para a reciclagem de materiais complexos. Peter Kolbe, da Kubota Brabender, centrou-se na gestão de materiais heterogéneos, e Bárbara Franch, da Ube, apresentou casos de sucesso com teores de materiais reciclados entre 10% e 30%, mantendo um elevado desempenho técnico.
Entre as duas últimas sessões, os projetos Cíclicom e Free4lib, nos quais a Aimplas participa, foram apresentados por Pablo Ferrero e Alicia Barbas. O seminário terminou com uma mesa-redonda sobre o cumprimento dos objetivos de reciclagem em setores como o têxtil, o elétrico-eletrónico, o automóvel e as energias renováveis, com apresentações de José David Allo, da Texfor; Paula Quintanilla, da Sostenplas; Juan Antonio Ruiz, da Antolín Ingeniería; e Helena Abril, da Aemac, que desmistificou o mito da não reciclabilidade dos materiais compósitos e apresentou soluções em biocompósitos e projetos de I&D como o Rewind.
A Plasrec contou com o apoio da Picvisa, GSF Up Cycling, Entzimatiko, Promak Solutions, Gravipes, Kubota Brabender, Anarpla, Anaip, Mayper, Acteco, Modus e Messer.
Fonte: iAlimentar