Portugal continua a registar um atraso significativo na recolha seletiva de biorresíduos alimentares, com apenas 19% dos alojamentos do território continental integralmente abrangidos por este serviço. A conclusão consta do Inquérito de Diagnóstico de 2025, realizado pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), que traça um retrato preocupante do cumprimento das obrigações legais nesta área.
O relatório, baseado nas respostas de 222 entidades gestoras (EG) – representando 94% do universo nacional – revela que 51% das EG afirmam já ter implementado a recolha seletiva de biorresíduos até outubro de 2025. No entanto, a maioria admite não cobrir a totalidade da área sob a sua responsabilidade, o que se traduz numa cobertura efetiva ainda muito limitada. Segundo Vera Eiró, presidente do Conselho de Administração da ERSAR, “como a maioria das entidades não disponibiliza o serviço em toda a sua área de intervenção, apenas 19% dos alojamentos do território continental estão efetivamente cobertos”.
Este cenário coloca o país longe do cumprimento da obrigação legal em vigor desde 31 de dezembro de 2023, bem como das metas definidas no Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos (PERSU 2030) e nas diretivas europeias. O objetivo nacional passa por garantir a recolha seletiva de biorresíduos em todo o território até 2030, com metas intermédias para 2026 e 2035. “Estamos com um atraso significativo, que exige um esforço acelerado para evitar o incumprimento das metas europeias”, alerta Vera Eiró.
Entre os principais obstáculos identificados pelas entidades gestoras estão a baixa adesão da população, mesmo após campanhas de sensibilização, a insuficiência de meios financeiros e humanos e diversos constrangimentos operacionais, como dificuldades logísticas, morosidade nos concursos públicos e falta de articulação entre a gestão em alta e em baixa.
No domínio do financiamento, as EG referem como principais fontes o POSEUR, os programas do Fundo Ambiental e os apoios comunitários previstos no PERSU 2030. Ainda assim, muitas entidades consideram que estes apoios são insuficientes ou chegam com atraso, condicionando a implementação dos sistemas de recolha.
Outro ponto crítico destacado pelo relatório é a fraca adoção do modelo tarifário Pay-As-You-Throw (PAYT), que visa incentivar a redução e separação de resíduos através de uma tarifação proporcional à produção. Em 2025, apenas 21% das entidades gestoras implementaram este sistema, praticamente sem evolução face ao ano anterior. A maioria continua a aplicar modelos indexados ao consumo de água, considerados menos eficazes na promoção da separação na origem.
As principais barreiras à adoção do PAYT incluem a complexidade técnica, os custos elevados de implementação e a resistência dos utilizadores, associada à perceção de aumento de encargos. Ainda assim, a ERSAR defende que “uma maior generalização do PAYT poderia dar um contributo decisivo para o cumprimento das metas europeias e para a redução da deposição de resíduos em aterro”.
Para inverter o atual atraso, a entidade reguladora sublinha a necessidade de reforçar os apoios financeiros, envolver mais ativamente as populações e assegurar uma monitorização contínua do cumprimento das obrigações legais por parte dos municípios, como condição essencial para uma gestão mais sustentável dos resíduos urbanos de origem doméstica.
Fonte: Grande Consumo