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Clínica e Patologia das Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis humanas

São quatro as EET humanas actualmente conhecidas: CJD, que inclui quatro formas: esporádica, hereditária, iatrogénica e "nova variante"; a DGSS e a FFI, hereditárias; o Kuru, também ele iatrogénico, já praticamente desaparecido.

 

São todas doenças bastante raras, caracterizadas por um longo período de incubação, invariavelmente fatais, por não haver tratamento específico.

 

Do ponto de vista neuropatológico, caracterizam-se por degenerescência esponjosa do parênquima cerebral, alteração típica mas não patognomónica, perda de neurónios, proliferação astrocitária reactiva e depósitos de PrP, evidenciados por técnicas de imunocitoquímica. Todas as estruturas do sistema nervoso podem ser atingidas, embora haja um claro predomínio da substância cinzenta (córtex) do cérebro e cerebelo e dos gânglios da base. Ao contrário do que se passa com a BSE, por exemplo, o tronco cerebral é bastante poupado.

 

Embora não os descrevamos, existem actualmente critérios clínicos, relativamente bem definidos, que permitem o diagnóstico provável ou possível em vida do doente.

 

O diagnóstico definitivo é sempre anátomo-patológico, igualmente com base em critérios histopatológicos.

 

A DGSS é autosómica dominante, raríssima (estão descritas apenas algumas famílias), atinge predominantemente o cerebelo, medula espinhal, cérebro e gânglios da base, e manifesta-se habitualmente por perturbações da coordenação motora e do equilíbrio, movimentos involuntários e demência. Conhecem-se cerca de meia dúzia de quadros clínicos que correspondem a outras tantas mutações do PRNP.

 

A FFI, igualmente autosómica dominante e bastante rara, manifesta-se por perturbações autonómicas (hipertensão arterial, taquicardia, hipertermia, etc.), disfunções endocrinológicas múltiplas, perturbação do sono e do sistema motor voluntário e involuntário. A estrutura mais atingida é o tálamo.

 

O Kuru, ligado a rituais canibalísticos, atingia quase exclusivamente o cerebelo, ocasionando graves perturbações da coordenação motora, a que se associavam movimentos involuntários e demência, esta exclusivamente na fase terminal da doença. Caracteristicamente, do ponto de vista anátomo-patológico, são típicos os depósitos de PrP, denominados "placas de Kuru".

 

A forma esporádica da CJD é a mais frequente das doenças humanas a priões, com uma incidência de um caso por milhão de habitantes por ano, e a sua etiologia não é conhecida. É característico o seu aparecimento na sexta ou sétima décadas de vida, dependendo as manifestações clínicas das estruturas mais atingidas. O quadro mais frequente consta de demência rapidamente progressiva, associada a movimentos involuntários de tipo mioclónico e mutismo acinético terminal, demorando o curso da doença habitualmente um ano ou menos. Os exames complementares importantes para o diagnóstico são o electroencefalograma (EEG), que mostra uma actividade periódica característica, bem como a positividade da proteína 14.3.3 no líquido cefalorraquidiano (LCR).

 

A forma hereditária, muito mais rara que a precedente, está ligada, tal como as doenças hereditárias do mesmo grupo, a mutações do PRNP e as manifestações clínicas, semelhantes às da forma esporádica, dependem dessa mutação.

 

A forma iatrogénica já foi parcialmente descrita no capítulo anterior. Acrescentamos que os casos mais frequentes e dramáticos desta forma referem-se ao atingimento de crianças com problemas de desenvolvimento, tratadas parentericamente com extractos de hipófise de cadáveres com CJD. Tal como as restantes formas iatrogénicas de exposição ou contaminação periférica (Kuru e "nova variante"), manifestam-se predominantemente por incoordenação motora, seguindo-se movimentos involuntários e demência.

 

A nova variante, a "BSE humana", da qual estão diagnosticados mais de cinco dezenas de casos até ao momento, atinge predominantemente os grupos etários mais novos, tem um tempo de evolução que anda à roda dos dois anos e manifesta-se inicialmente por um quadro psiquiátrico que nada tem de específico (ansiedade, depressão, alucinações, etc.), ao qual se associam, caracteristicamente, perturbações sensitivas de tipo disestésico (percepção dolorosa de um estímulo táctil) e dores atípicas. Cerca de seis meses depois, surge o quadro neurológico que consta de descoordenação motora, por atingimento do cerebelo, movimentos involuntários mioclónicos e, finalmente, o síndroma demencial. O EEG bem como o doseamento da proteína 14.3.3 não se têm mostrado valiosos no diagnóstico. A ressonância magnética nuclear cerebral, por seu lado, pode evidenciar alterações nos gânglios da base.

 

A biópsia das amígdalas palatinas, tendo em conta a contaminação precoce dos órgãos linfáticos destes doentes, tem sido útil numa percentagem assinalável de casos, revelando depósitos de PrP. O diagnóstico definitivo, anátomo-patológico, mostra, caracteristicamente, os referidos depósitos no cérebro e cerebelo.

 

 

 

Fonte: Direcção-Geral da Saúde (DGS)

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