Portuguese English French German Italian Spanish

  Acesso à base de dados   |   email: qualfood@idq.pt

Epidemiologia e transmissão da BSE ao Homem e a Nova Variante da Doença de Creutzfeld-Jakob (vCJD)

O facto da BSE ter sido transmitida, experimentalmente, a animais da mesma e de espécies diferentes, por injecção intracerebral do encéfalo e medula infectada, e também, por via oral, a diversas espécies animais, constitui motivo de preocupação, tendo em conta que essas experiências significam que não só o agente da BSE passa a barreira da espécie, mas também pode ser transmitida por via oral.

 

A possibilidade de transmissão inter-espécies depende de diversos factores: barreira da espécie, dose de inócuo, via de inoculação e estirpe do agente. Quanto ao primeiro, ela depende do grau de afinidade entre a PrP' da espécie infectante e a PrP' da espécie hospedeira para a formação de heterodímeros e conversão na isoforma patogénica. Salienta-se ainda que a barreira da espécie não é obrigatoriamente absoluta. Significa apenas a necessidade de uma maior dose de inócuo para passagem à nova espécie, com tempo de incubação consideravelmente mais longo, aliás o que se passa na nova variante da vCJD.

 

Quanto à dose de inócuo e via de inoculação, o risco de infecciosidade dos diversos tecidos ou órgãos utilizados na alimentação é muito diferente. As determinações de infecciosidade foram feitas por inoculação intracerebral de murganhos sensíveis ao Scrapie, situação que na infecção por via oral, como seria na eventual contaminação humana por alimentos, não corresponde à realidade, dado saber-se serem necessárias doses 100 000 vezes maiores para transmitir a doença.

 

Assim, se o encéfalo e a medula têm a mais alta infecciosidade, o músculo, o leite, o rim, entre outros, não apresentam infecciosidade detectável. No entanto, se a infecção por via oral parece ser mais difícil, há que ter em conta situações particulares de maior risco de inoculação parentérica, seja por administração de produtos farmacêuticos, transfusões ou risco profissional. As formas iatrogénicas de CJD e o Kuru são exemplos humanos de transmissibilidade das EET e corroboram essa possibilidade.

 

Considerado o agente infeccioso da BSE como um prião e dada a elevada diferença na sequência de aminoácidos entre o prião da vaca e o humano (diferindo em mais de 30), foi considerada inicialmente, por Prusiner, como pouco provável a possibilidade de priões bovinos ingeridos oralmente poderem agir como "indutores" capazes de distorcer os priões humanos e dar origem à doença, de acordo com a teoria elaborada por este autor. Outros factores, provavelmente celulares, também controlam a replicação da PrP, nomeadamente os genéticos, e é curioso o facto de todos os casos de vCJD serem homozigóticos, para a metionina no códão 129 do gene da PrP. No entanto, foi-se progressivamente acumulando evidência duma ligação entre a BSE e a CJD.

 

Primeiro, o aparecimento da epidemia da BSE no RU, em meados da década de 80, e a constatação do aumento da incidência de CJD neste país, que quase duplicou entre 1990 e 1994, juntamente com o reconhecimento da vCJD, que constituiu a primeira sugestão dum possível elo entre a BSE e a vCJD. Outra descoberta significativa neste sentido, em Junho de 1996, foi a observação dum quadro neuropatológico, idêntico à chamada nova variante de CDJ, em 3 macacos inoculados intracerebralmente com BSE, e que, embora não por via oral, veio sugerir adicionalmente a possibilidade de ligação entre o agente da BSE e a doença no ser humano.

 

Em Outubro de 1996 o investigador inglês Collinge publicou um artigo em que anunciou a primeira evidência científica consistente entre a conexão directa entre a BSE e vCJD com a descoberta duma identidade físico-química (a chamada assinatura da BSE) entre os priões dos doentes que faleceram com vCJD, de vacas com BSE e macacos experimentalmente infectados com BSE, após transmissão ao ratinho. Por outro lado, também conclui que estes priões diferiam dos encontrados na forma clássica ou esporádica de CJD, confirmando a emergência duma nova entidade e contribuindo para a possibilidade dum teste diagnóstico ante-mortem para a vCJD.

 

Desenvolvimentos posteriores, relativamente recentes, mostraram que os priões anormais se replicam nos tecidos linforeticulares antes da neuroinvasão, o que se veio a revelar na prática com a realização de biópsias de tecidos de origem linfóide, nomeadamente da amígdala e a sua positividade para o agente da vCJD, ao contrário da forma clássica de CJD.

 

Em combinação com outros estudos, estes constituem a prova mais evidente duma conexão causal da infectividade da BSE aos humanos (excluída, por razões óbvias, a possibilidade da inoculação no Homem).

 

Presentemente, ainda não se conhece o tempo médio de incubação do agente da BSE, nem a dose necessária para a infecção em humanos e até a absoluta certeza das vias de infecção (directa, por via oral? Através de intermediário?), pelo que a compreensão da biologia das EET é incompleta e continua a ser imprevisível o número futuro de casos de vCJD.

 

Os resultados do megaestudo, em curso no RU, da incidência de sujeitos assintomáticos com tecidos de origem linfóide positivos, para a PrP anormal, trarão eventualmente novos dados para a clarificação destes assuntos.

 

Entretanto, mesmo com riscos considerados pequenos, deverão ser mantidas e até reforçadas todas as medidas em curso no sentido de minorar, o mais possível, o risco de transmissibilidade do agente da BSE.

 

 

 

Fonte: Direcção-Geral da Saúde (DGS)

Conteúdos