Na natureza há numerosas variedades de cogumelos e muitas delas são tóxicas. A intoxicação é frequentemente acidental, pelo facto das espécies venenosas serem muito semelhantes às comestíveis.
Há espécies que não são habitualmente tóxicas, mas que podem tornar-se tóxicas quando decorre algum tempo entre a colheita e o seu consumo. Algumas espécies venenosas podem ser comestíveis se forem preparadas de certa maneira, mas existe sempre a possibilidade de intoxicação se a preparação for incorrecta. Há também casos de susceptibilidade individual a componentes de certos cogumelos, que são inócuos para a generalidade dos consumidores.
A maior parte das espécies venenosas causa apenas sintomas gastrointestinais passageiros, mas algumas possuem toxinas poderosas que podem causar a morte.
Os cogumelos mais perigosos são os do género amanita, cujos componentes tóxicos são diversos polipéptidos cíclicos, como as falotoxinas e as amatoxinas.
Os ciclopéptidos encontram-se em várias espécies de amanitas, como os phalloides e os muscaria. Outras variedades contêm tóxicos diferentes: o género gyromitra contém metilhidrazina, a espécie coprinusatramentarius contém coprina, os géneros inocybe e clitocybe possuem muscarina. Outras categorias de cogumelos venenosos contêm substâncias que causam habituação, como certas espécies do género amanita, por possuírem muscinol e ácido iboténico, ou os géneros psilocybe, panaeolus e gymnophilus, por conterem indóis do tipo da psilocybina.
Entre a ingestão e o início das manifestações de intoxicação há habitualmente um certo tempo de latência. A espécie amanita phalloides possui um tempo de latência de cerca de 6 a 24 horas (maior frequência de 10 a 14 horas), enquanto que os amanita mata-moscas e pantera ou os géneros inocybe e clitocybe actuam bem mais rapidamente, entre 15 minutos e 2 horas após a ingestão.
Tomando em consideração o tipo de acção tóxica e as manifestações clínicas da intoxicação, podemos individualizar sete grupos de cogumelos venenosos, seis das quais possuem importante neurotoxicidade.
Os do primeiro grupo, várias espécies do género amanita, contêm ciclopéptidos, principalmente amatoxinas. Em 6 a 24 horas, originam manifestações gastrointestinais e em 3 a 5 dias provocam insuficiência hepática e renal.
Os do segundo grupo contêm giromitrina (monometilhidrazina) e actuam por competição com a actividade da piridoxina ou vitamina B6. Está neste grupo o género gyromitra.
Em 6 a 12 horas causam manifestações gastrointestinais, hemólise e convulsões, que podem ser revertidas com administração de piridoxina.
Os ciclopéptidos dos cogumelos do grupo 1 (espécies phalloides, virosa, bisporigera, mata-moscas e pantera do género amanita) e a giromitrina dos cogumelos do grupo 2 (género gyromitra) originam as seguintes manifestações:
- náuseas e vómitos;
- cólicas abdominais;
- diarreia;
- agitação e irritabilidade;
- ataxia e vertigens;
- delírio e alucinações;
- convulsões;
- coma;
- miopatia necrosante, com paralisia flácida arrefléxica e CPK elevado.
Os cogumelos do grupo 3 contêm coprina, que inibe a acção da desidrogenase do aldeído acético, provocando efeito antabus, semelhante ao do medicamento Dissulfiramo, que é utilizado na desabituação etanólica. Neste grupo está, por exemplo, o Coprinus atramentarius. Vinte minutos a duas horas após a ingestão deste cogumelo aparecem rubor facial, palpitações e cefaleias, apenas e sempre que for ingerida uma bebida que contenha álcool etílico.
Os cogumelos do grupo 4, dos géneros Inocybe e Clitocybe, contêm muscarina e possuem em efeito agonista colinérgico, provocando hiperactividade colinérgica cerca de 30 a 120 minutos depois de ingeridos.
Por estimulação parassimpática, provocam os seguintes sinais de intoxicação:
- lacrimação, salivação e perspiração;
- náuseas e vómitos;
- diarreia;
- miose;
- bradicárdia;
- broncoespasmo;
- hipotensão arterial.
Na intoxicação grave aparecem também:
- tremor;
- convulsões;
- delírio.
O consumo repetido de cogumelos venenosos dos grupos 5 e 6, que contêm substâncias alucinogénicas, pode originar habituação.
Fonte: Almeida, Luís Bigotte de, “O Sortilégio de Pandora – O sistema nervoso e os tóxicos”; Lisboa; Gradiva – Publicações, Lda; 2004